Alí, na margem direita do caudaloso rio Paraibuna, havia uma pequena árvore.
Muita gente nunca deve tê-la notado. Ficava debruçada sobre o rio, perto do bairro Santa Terezinha, pouco antes da ponte da rua Rui Barbosa.
Era solitária, naquele local. Mais à frente existiam árvores muito maiores do que ela, enormes, que lançavam seus galhos sobre a avenida Brasil e também sobre o rio.
Mas ela ficava um pouco antes, meio escondida pela barranca do rio.
Chamava-me a atenção por ter nascido e sobrevivido numa posição esquisita. Não estava nem totalmente na beira do rio nem tampouco na margem de cima, onde fica a calçada. Ficava ali, no meio do barranco, um tanto torta, é verdade, mas firme.
O que me fez prestar atenção nesta pequena árvore foi o fato de suas folhas e galhos se lançaram para o rio, muitas vezes tocando as águas.
Por esta característica, me valia dela para medir a cheia no verão. Sempre que chovia muito, eu passava por ela para ver até que altura a água havia alcançado seus galhos. Daí, sabia se havia chovido muito ou pouco, em relação a outras cheias.
Me intrigava as folhas submersas. Não morriam. Surgiam sujas quando as águas baixavam, tomadas de barro.
Aí que eu me surpreendia: Vocês nem imaginam o quanto de sujeira que ficava agarrada nos galhos. Sacolas, fios, madeira, galhos de outras árvores. Uma zona danada. Demorava muito tempo praquilo secar e soltar da árvore. Graças ao vento, ela tornava a se limpar destes hospedeiros indesejados.
E ali ficava, como sempre, esperando nova chuva e cheia. Ela não dava frutos, somente umas flores pequenas e brancas. Não acho que ninguém mais se importava com ela.
Passaram-se os anos e surgiu o projeto de uma ponte, próximo ao local onde ficava a minha árvore. Temi por ela. Mas nada houve: a ponte, cuja estrutura era lançada, aérea, ficou alguns metros antes dela, sem atingi-la.
Mudei para um bairro cujo trajeto de saída me fazia usar esta mesma ponte, e continuei a acompanhar as cheias do rio através dos galhos da árvore, num ângulo diferente agora.
Mas o progresso trouxe problemas. Creio eu que, com cada vez mais asfalto e concreto cobrindo a terra, as cheias ficaram cada vez maiores e perigosas. As águas não transbordavam, mas desciam as curvas do rio de forma vigorosa. Minha árvore morava numa destas curvas.
A tragédia foi anunciada.
Mais à frente do local onde ficava a árvore, a barranca caiu pela força das águas. A prefeitura tratou de reforçar a lateral do rio com uma parede de pedras.
Mas veio outra chuvarada, e desta vez não houve perdão. As águas tombaram a árvore, arrancaram o barranco onde ela ficava, colocaram suas raízes à mostra e carregaram-na para dentro do rio.
Nunca havia visto uma cheia como aquela. Era muita água. A ponte nova quase foi submersa pela água.
Minha árvore não tinha mais salvação...
Passada a cheia, alguém, talvez os bombeiros, foram até lá e podaram o que restou dela.
Perdi minha referência e minha única “amiga” do reino vegetal. (Mentira! Eu tenho uma “flor de maio” em casa)
Nada fiz por ela, mas ela me serviu por muito tempo, mesmo à distância.
Às vezes passo por lá e lanço o olhar para o local onde ela cresceu e morreu. Quando o rio baixa, no inverno, vejo um pedaço de tronco junto às pedras, mais à frente. Creio que seja um pedaço dela, mas não tenho certeza.
Tenho vontade de plantar uma árvore na beira do rio, mas creio que o serviço de capina ou a draga a mate antes de crescer.
Um dia planto uma árvore, mas vou ter que achar um local mais protegido, pra deixá-la crescer em paz, e purificar um pouco de ar pra que eu possa respirar melhor...
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